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quinta-feira, setembro 03, 2020

Mais um pouco sobre autoimagem


 

Ontem eu escrevi sobre não conseguir me ver como realmente sou.

Faz meses que comecei a perceber isso. Primeiro notei que me via sempre pelo olhar dos outros. Estava sempre esperando um feedback pra saber o que cada pessoa pensava de mim e a partir daí criar a minha imagem.

Imagina só! No final eu era um mosaico. Cada pessoa refletindo um pedaço diferente e eu querendo obter uma imagem decente no final desse processo.

Foi o primeiro sinal de que havia algo bem desencontrado em mim.

Aí que começou a minha busca pela minha essência. Afinal, eu estava disposta a descobrir quem eu era de verdade, mas tudo o que eu tinha naquele momento eram os pedaços que cada pessoa me entregava e (o que mais me assombrava) o que elas não diziam?

Meu Deus, quantas noites de sono perdido imaginando o que em mim seria tão terrível a ponto das pessoas nem sequer me dizerem?

Sim, porque a gente não chega praquela pessoa chaaaata e diz na cara dela que ela é a maior chata do mundo!

Então os pedaços que me faltavam, eu ainda completava com o mais terrível que eu conseguia imaginar. Na minha cabeça eu usava como desculpa que era pra não ter erro, melhor ser consciente da minha sombra, certo?

O problema que eu não estava consciente da minha sombra, estava era criando uma sombra imaginada, saída de um filme de terror dos mais cabulosos.

Se essa imagem pudesse ser vista, estaria num museu como a sombra mais tenebrosa já desenhada pela imaginação de alguém.

Fiz um ótimo trabalho em me pintar como um monstro.

Mas e daí?

Daí que errei feio. Alguém lembra como funciona a lei da atração? 

Se eu me acho terrível, o que mesmo que as pessoas vão achar de mim?

Então imagina só a chuva de críticas que era a minha vida... Genteeeeee parecia que nada do que eu fazia tava certo. Nadinha.

E eu só tinha puxado um pedacinho do véu que cobria a verdade. Tava começando a tentar entender o que eu tava descobrindo e ainda nem sabia direito por onde começar a trabalhar essa questão quando a pandemia começou!

A iludida aqui, achando que ia tirar a quarentena de letra, afinal, minha vida era casa-trabalho-casa.

Mas um 2020 que se preze não deixa por isso mesmo! Quem disse que eu teria direito a quarentena?

Levei um solavanco, fui arrancada de casa e jogada no mundo real. Cristo, que loucura! Ter que coexistir com pessoas? Eu????

E pra quê tempo pra pensar? Quanto mais eu pensasse, mas bobagem eu ia imaginar mesmo. Então a vida se encarregou direitinho de nem me deixar respirar. Me jogou de brinde ainda pessoas incríveis pra eu nem ter do que reclamar.

Depois de novos amigos, reencontro com velhos amigos, contatos de todos os tipos, muita observação e muitas lágrimas no escuro do meu quarto (porque tenho meu pezinho em peixes) e alguma terapia, começo a achar que talvez exista alguma possibilidade de ter alguém legal aqui dentro.

Você deve estar lendo e pensando "minha nossa, essa mulher deve ter algum problema estético terrível, ou algum transtorno de personalidade". Mas não, o meu transtorno tem relação com autoestima. E, se você me ver na rua, pode até me achar bonita. Não são poucas as pessoas que acham que eu me acho e, isso pra mim é a prova de que realmente há um problema. 

Quando falo superficialmente pra alguém sobre como me sinto comigo mesma, é comum ouvir "Nossa, mas você finge bem, então!"

Amigo, eu não finjo. Eu tento desesperadamente, com todas as forças do meu ser, a cada segundo do dia apenas ser alguém aceitável em sociedade. 

O trabalho está apenas começando, eu sei bem. Mas só de já ter entendido que talvez a parte a ser mudada não era exatamente aquela que eu imaginei, já me faz ter uma esperança de conseguir algum progresso.


Créditos da imagem: wallpaperup.com

quarta-feira, setembro 02, 2020

O monstro no espelho


Recebi as fotos que a minha terapeuta tinha prometido!

Estava ansiosa, havia passado a tarde inteira pensando nisso, já estava até considerando comprar os livros.

Nas fotos, eram as páginas dos livros de astrologia cármica, que mostravam o significado do meu nodo norte!

Finalmente eu teria um pouco mais de informação sobre pra onde diabos eu tenho que ir nesta vida!

E bastou uma leitura rápida pra me saltarem aos olhos expressões como: “resíduos de selvageria” e “macaco em loja de louças”. Isso quase que imediatamente me transportou de volta aos meus 15 anos.

Lá estava eu de novo, no silêncio do meu quarto, aos prantos, me sentindo um ogro que gostaria de poder jamais sair da sua caverna escura.

Engoli essa lembrança involuntária e segui com a minha leitura.

Aparentemente o nodo lunar norte no signo de gêmeos explica o motivo de eu sentir que nunca termino de cumprir com as minhas responsabilidades para poder então, ser livre ou pelo menos me sentir assim.

Mesmo o comentário dela sobre viver envolto em muitas atividades em referência a um trecho das páginas enviadas, não me trouxe de volta ao bom senso.

Não, eu preferi ficar ali, me sentindo um ser horrendo, sem modos, grotesco, numa interpertação extremamente negativa do que tinha lido.

Em seguida chegam mais páginas.

Pronto, agora sim, era hora do massacre.

Nodo norte na casa 5: vamos lá.

Resumindo, o autor me chama de criança sonhadora que nega a realidade e só sabe colocar os pés pelas mãos.

Pra ajudar ela ainda manda em destaque um trecho que fala da dificuldade em estabelecer relacionamentos e casamentos.

Pronto. Tinha começado o momento autopiedade.

Mas detalhe: como uma boa ariana, minha autopiedade não é nada triste e serena. E nem conformada, do tipo “pobre de mim, mas fazer o quê?”. Não! Longe disso!!! A minha autopiedade é um ato de rebeldia contra a vida. É um desafio ao universo, que não está sendo lógico e nem sensato ao vir pra cima de mim com as suas supostas leis!

Deve ser cômico, na verdade.

Bom. Dessa vez consegui controlar a raiva, pelo menos.

Mas fiquei chateada.

Autorzinho besta, nem me conhece e acha que pode dizer isso de mim?

Seguindo os recentes conselhos da minha terapeuta, resolvi esperar. Ela tinha dito alguma coisa sobre não precisar fazer nada a respeito do que sinto, só sentir.

Não me pareceu muito útil, mas na hora resolvi tentar.

Levou alguns (muitos) minutos pra eu perceber que o texto não era algo pessoal.

Afinal, o cara lá escreveu isso sobre todas as pessoas que tem essa configuração astral.

E, puxa vida, deve ter gente legal aí no meio.

Tenho percebido que eu realmente não me vejo como sou. E não do tipo de pessoa que não enxerga seus defeitos, mas o tipo que não enxerga suas qualidades!

Quando eu me olho, coloco tanto peso, tanta crítica e até uma certa crueldade, que o texto que eu li, acho que não foi o mesmo que ela leu.

Definitivamente não foi. Porque eu não teria destacado as mesmas frases que ela destacou.

Pra ela, eu sou uma pessoa que se interessa por muitas coisas ao mesmo tempo, com dificuldade de focar.

Pra mim, sou um ser grosseiro e selvagem incapaz de viver em sociedade.

Estou com um sério problema de visão. Meu espelho está estragado.

“Problema de auto imagem” ouço a voz do Bruno dizendo.

Mas eu já sabia disso. Sei disso há meses.

Porém, acho que só agora é que estou entendendo as dimensões dessa distorção.

Cada vez que alguém tentava me dizer que eu não estava me vendo direito, eu achava que estavam falando dos meus defeitos, e me julgava com mais severidade ainda.

Eu me fiz feia. Coloquei um holofote sobre as partes mais desagradáveis do meu ser e tentei arrancar de mim essas partes, me tornando além de tudo, um ser despedaçado.

Hoje, pela primeira vez, passa pela minha cabeça a possibilidade de eu ser como os outros, de eu ter qualidades. Essas que eu passei a vida toda buscando e nunca parei pra ver apreciar.

Gostaria de poder falar mais sobre isso, mas tudo o que sei até agora é que toda vez que eu olho no meu espelho interior vejo o Nick ali de cima. Pensar que talvez do outro lado tenha uma moça simpática já parece algo muito novo. Mas vou começar a procurar por ela, quem sabe qualquer hora ela aparece?

 

Créditos da imagem: freepik